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RECANTO DA PROSA

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Bartleby e companhia



No último domingo, dia 01 de agosto, celebramos o aniversário de Herman Melville - o que me fez lembrar que eu estava devendo uma resenha de um livro inspirado por uma novela do autor. A novela se chama Bartleby, o escrivão; e o livro que trago hoje, Bartleby e companhia, de Enrique Vila-Matas.


Antes de começar, de fato, a resenha, acho interessante comentar brevemente a novela de Melville, que nos trouxe uma das personagens mais enigmáticas que já vi. A história é narrada por um advogado de caráter dócil e muito "seguro", que possui um pequeno escritório, onde leva uma vida sem grandes acontecimentos, acompanhado de seus três funcionários. Com a expansão dos negócios, o advogado se vê obrigado a contratar mais um escrivão e é então que surge Bartleby, um homem calado e imperturbável, que gradativamente começa a se recusar a fazer tudo o que lhe pedem, usando sempre as mesmas palavras: "Prefiro não". A situação vai se tornando a cada dia mais insustentável, uma vez que Bartleby prefere não fazer o seu trabalho, não ir embora do escritório, nem ser demitido. A história provoca múltiplas interpretações e ao fim, deixa uma sensação incômoda de que - assim como o advogado - não chegamos a compreender completamente o que se passou ali.


Mas vamos agora à resenha de hoje. Inspirado por essa figura excêntrica e misteriosa, Enrique Vila-Matas se propôs a escrever um compilado de "notas de rodapé" a respeito de múltiplos autores (reais e fictícios), que, como Bartleby, concluíram que preferiam não mais escrever. Intrigado acerca dos possíveis motivos pelos quais grandes autores, alguns no auge de sua escrita, escolheram o silêncio, Vila-Matas se dispõe, assim, a "passear pelo labirinto do Não" - e o faz mesclando formas e gêneros literários diversos, naquilo que convencionou-se chamar de "ficção híbrida".


O livro, no entanto, feito de costuras desses "sóis negros" da literatura, resulta em algo muito maior do que uma mera colcha de retalhos; pois induz o leitor a pensar sobre questões muito maiores do que o (aparentemente) simples: por que um escritor deixa de escrever? A leitura de Bartleby e companhia nos leva a diversas outras perguntas, inclusive ao próprio avesso da questão proposta, que seria: por que um escritor escreve? Por que dessa necessidade de registrar experiências, sensações e, o que é mais louco: acontecimentos que nunca aconteceram, pois só existem no plano da imaginação?


Ademais, o autor nos faz refletir sobre o próprio fazer literário, as relação entre arte e vida, a questão da originalidade (diante da ideia de que tudo o que poderia ser dito já o foi), o (des)lugar do escritor no mundo, os livros que não foram escritos (mas existem em algum lugar suspenso dentro de cada artista) e a morte - o silêncio definitivo. O curioso de tudo isso, no entanto, é que a leitura me despertou um forte desejo de escrever um novo romance, desejo este que partiu principalmente de uma citação de Susan Sontag, com a qual me deparei no livro:


"A atitude realmente séria é aquela que interpreta a arte como um meio para obter algo que talvez só se possa alcançar quando se abandona a arte". (p. 73)


Dá no que pensar, não? De fato, o texto de Vila-Matas parece apontar para um potência de criação que nasce dessa pulsão negativa. De minha parte, o que posso dizer é que recomendo fortemente a leitura de Bartebly e companhia a todas e todos os que se predispõem a escrever ou a estudar a arte da escrita; que o texto fornece incontáveis referências interessantes sobre a vida e obra de grandes autores da literatura mundial; e que, com certeza, vou querer reler tudo em algum momento, pois sinto que esse é um daqueles livros que parecem nunca lidos a cada leitura.


Concluo esta resenha com um trecho do texto de orelha, que, na minha opinião, resume bem a questão central do livro (se é que existe algum centro nele):


"Escrever sobre o ato de não escrever talvez seja contraditório. Por isso mesmo Bartleby e companhia é estruturado como uma série de notas de rodapé a um texto invisível. Porém, mais do que isso, à medida que a leitura avança, vai ficando óbvio que o 'labirinto do Não' é um terreno fértil de onde brotará o futuro da escrita literária."

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