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RECANTO DA PROSA

Cantinho dedicado à leitura e à troca de ideias entre os amantes da literatura. Sinta-se em casa!

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Esse aqui é pra você




Neste ano não vai dar pra abraçar. O que é bem chato, considerando o quanto os abraços pandêmicos foram econômicos nos últimos dois anos, apenas em ocasiões especiais. Aniversários, Natal, Ano-novo, Dia das Mães. É. Esse ano não vai rolar. Porque também houve abraços quando passei num mestrado a 1800 km de distância; desejo antigo, uma espera de dez anos, mudança às pressas, três meses e ainda tem coisa na mala porque sinceramente nunca passei por um primeiro quadrimestre tão insano. Na correria nos falamos pouco, essa desculpa péssima da qual todos iremos nos arrepender um dia: “falta de tempo”, esse raio de frenetismo em que todo mundo parece ter se atolado.


Neste ano não soube o que te dar de presente, sou péssima com presentes, juro que tento, penso por dias, procuro bastante e no fim sempre tenho a sensação de ter errado. Apenas no dia seguinte me vem uma iluminação tardia e besta de algo que poderia ter sido melhor.


Pois bem. Vamos então a uma nova tentativa, torcendo pra não errar dessa vez. Nos últimos dias ando cantando obsessivamente a mesma música o tempo todo, uma antiga do Elton John – sou brega nesse nível, mas tenho todo o direito de culpar a memória afetiva dos discos de vinil do meu pai – uma que ainda por cima virou medley em Moulin Rouge, um musical que adoro e que aluguei escondida quando alugar VHS era o jeito. (Disso não tenho nostalgia alguma, se dependesse de mim, assinaria uma meia dúzia de canais de streaming). Aluguei escondida por causa da censura; o atendente da locadora olhou feio porque era seu dever, avisou que o filme era para maiores de 14 anos, menti que eu já tinha, ele fingiu acreditar, não pediu documento, passou a caixinha de plástico no código de barras e disse pra devolver rebobinado, senão tinha multa. (Sério, por que alguém tem as caras de dizer que sente saudades disso?).


A música começa com uns versos bem bregas, como de praxe ao Elton John. É romântica, não vem ao caso do contexto, algo como “se eu tivesse dinheiro, compraria uma casa bem grande pra gente, se eu fosse um escultor... se fizesse poções...”, nada a ver. Mas há um trecho que cabe, acho bonito, e esse vale ser traduzido literalmente:


“Eu sei que não é muito, mas é o melhor que posso fazer

Meu presente é minha canção, e essa aqui é para você

E você pode contar pra todo mundo que essa canção é sua

Pode ser bem simples, mas agora que está pronta

Espero que você não se importe que eu expresse em palavras

Como a vida é maravilhosa com você nesse mundo”


Estou a 1800 km de distância, não tenho como te abraçar, já faz dias que ando vasculhando lojas e sites de compras à procura de algo decente, mas tudo parece ter um forte potencial para arrependimentos tardios e bestas. Daí que é isso: essa canção – ou melhor, este texto – é para você; e lamentavelmente é o melhor que tenho pra hoje. Ao menos uma parte de mim se consola porque sei que você vai gostar. Não porque o texto seja muito bom, não ando no auge da minha capacidade criativa, mas porque é honesto e porque, de qualquer modo, já faz uns 20 anos que você chora com tudo o que eu escrevo, num orgulho desmedido diante do que tenho a oferecer.


No último livro que publiquei, te agradeci pela pasta onde você guarda impressos todos os meus textos, mas faltou agradecer por guardar também os desenhos de criança, as besteiras publicadas nas primeiras antologias em que me inscrevi, os relatórios de estágio da faculdade que (num rompante de ódio e faxina) joguei fora e você catou pra guardar; o nicho da estante reservado aos meus livros e os comentários nos posts que escrevo por aqui – e que às vezes, sinto que só você lê. Faltou agradecer pelos gritos de alegria quando passei no mestrado, mesmo sabendo o quanto a distância ia te doer por – nômade que sou – me ver indo embora outra vez. Também faltou agradecer pelas risadas que dei quando descobri que você tinha impresso e encadernado o currículo que mandei para o processo seletivo, orgulhosa dos meus parcos feitos. E faltou pedir desculpas pela economia nas ligações e nas mensagens de whatsapp, quando meu trabalho, afinal, é usar palavras.


Espero, no entanto, que como aconteceu ao Elton John, o sol seja gentil comigo enquanto escrevo essa canção, pois – palavras dele, não posso tomar o crédito – é por pessoas como você que ele continua a brilhar. E fecho com mais versos, porque realmente gosto da música e acho que ele mandou bem melhor do que estou mandando hoje:


“Então me desculpe por esquecer, mas eu faço essas coisas

Veja só, eu esqueci se eles são verdes ou se são azuis

De qualquer forma, o que eu realmente quero dizer é que

Seus olhos são os mais doces que eu já vi”



Obrigada por tudo. E feliz Dia das Mães.

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